Há mais de um ano a população brasileira adotou uma prática diária incomum em seus hábitos e que ainda permanece: o uso de máscara. A medida é um dos protocolos de prevenção de infecção pelo novo coronavírus, que utiliza as vias aéreas como uma forma de acesso ao organismo do ser humano. Outra porta de entrada são os olhos e, por isso, muitos vão mais além e utilizam a chamada face shield, uma proteção a mais contra o inimigo invisível a olho nu.
Prática incomum para nós, mas muito vista em parte da população asiática, por exemplo, a proteção facial é um elemento que acompanha os japoneses há décadas, como forma de autocuidado, ou por respeito ao próximo quando se está doente e assim evitar novas infecções. Dentro desse contexto de pressão social, as autoridades do país não tiveram dificuldades na adoção de medidas protetivas contra a Covid-19 por parte da população, o que fez do Japão um exemplo entre as grandes potências no enfrentamento da pandemia. São 777 mil casos e cerca de 14 mil mortes.
Se no Japão a prática já comum do uso de máscara ajudou a conter a propagação do novo coronavírus desde o início, no Brasil, o hábito não popular, aliado ao distanciamento social e higiene de mãos, teve um resultado além do esperado pelas autoridades sanitárias: queda no número de casos de outras doenças respiratórias.
De acordo com a Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz), a ocorrência de outras infecções caiu em mais de 70% e as internações de casos pediátricos graves foram reduzidas em 80% até agosto de 2020. Dos 218.904 casos respiratórios registrados no país até o período, apenas 1.814 foram em razão do vírus influenza (A e B), que causa a gripe, e 1.047 por vírus sincicial respiratório (VSR), que se manifesta mais em bebês. Mais de 97% das infecções foram pelo novo coronavírus. Em 2019, foram 5.417 casos de influenza e 5.765 por VSR.
Sem a adoção do uso de máscara e outras medidas de proteção, o Brasil teria tido consequências muito mais graves. “O uso de máscaras é essencial no controle da Covid-19. Caso o uso de máscaras não tivesse sido adotado, muito provavelmente hoje teríamos dezenas de novas variantes originadas no Brasil, além de um número de mortes que poderia ser 5 a 10 vezes maior do que o atual”, diz o infectologista da SPDM, Rafael Pardo. Atualmente, o Brasil tem mais de 17.500.000 casos e mais de 488.000 mortes pela doença.
Sobre deixar o uso de máscara, isso deverá acontecer quando uma alta parcela da população estiver com a imunização completa e assim o risco das pessoas desenvolverem casos graves da Covid-19 reduzido. Rafael Pardo ressalta que a “suspensão do uso de máscaras deverá ocorrer provavelmente quando mais de 70% da população estiver vacinada com as duas doses” e lembra da importância do desenvolvimento de um medicamento com eficácia cientificamente comprovada: “acredito que o uso de máscaras deverá ser incentivado, em ambientes fechados ao menos, até que algum antiviral efetivo contra o SARS-CoV-2 seja desenvolvido e utilizado amplamente”.
Tendo em vista que o uso de máscara tem como objetivo prevenir a disseminação de doenças respiratórias, a medida pode deixar um legado naqueles que se preocupam com a própria saúde e a de pessoas próximas, o de não querer ser o responsável pela transmissão e adoecimento de seus contatos, assim como os japoneses, que preferem não carregar essa culpa.
“O uso de máscaras se tornou um hábito em nosso país, no entanto, acredito que seja muito mais pelo fato de haver um decreto do que pela vontade da população. A meu ver, algumas pessoas passarão a usar máscaras quando se sentirem doentes, porém, a grande maioria ainda permanecerá como era antes da pandemia de Covid-19”, afirma Rafael Pardo.