Imagine ouvir de um médico que seu filho foi diagnosticado com autismo. Para os pais é um choque e um mergulho em um mundo desconhecido, na maioria das vezes. Começa então um aprendizado por parte dos pais, para tentar entender este mundo completamente novo. Apesar de já ter sido retratado em filmes e novelas, o autismo ainda é um tema cercado de dúvidas e, infelizmente, de muitos preconceitos.
Mas afinal, o que é autismo?
“O Transtorno do Espectro Autista é um transtorno do neurodesenvolvimento com prejuízo na área da comunicação e interação social em múltiplos contextos, associado a comportamentos restritos e repetitivos, interesses restritos e alterações sensoriais”, explica a psiquiatra Maria Tereza Rosa, Coordenadora da Equipe de Psiquiatria Infantil do Ambulatório Médico de Especialidades (AME) Psiquiatria Vila Maria, unidade administrada em parceria com a Associação Paulista para o Desenvolvimento da Medicina (SPDM).
Antigamente, os diferentes níveis de autismo eram classificados em diversas síndromes, como a Síndrome de Asperger ou Autismo Clássico. Mas hoje, de acordo com o DSM 5 (Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais) não há mais subdivisões. O nome “espectro autista” vem justamente para englobar as diferentes gradações da doença.
Como saber se meu filho tem autismo?
A especialista explica que os sintomas do autismo podem estar presentes desde o nascimento da criança, mas se tornam mais evidentes por volta dos 18 meses. “O diagnóstico de autismo não é feito devido a um sintoma isolado. Mas alguns sinais podem levantar suspeita e indicar uma avaliação especializada”, destaca a psiquiatra.
Alguns dos sinais que podem levar os pais a desconfiar de algo são:
- Não existe um exame específico para diagnosticar o autismo, ou seja, o diagnóstico é clínico, feito através da avaliação do caso por um profissional especializado.
- O principal comprometimento causado pelo autismo é na comunicação e interação social. “São observados déficits no uso da linguagem não verbal e dificuldade em agir de acordo com o contexto social”, explica Maria Tereza.
- A sensibilidade sensorial de uma criança autista também pode ser alterada – o processamento dos estímulos vindos dos órgãos dos sentidos, como são recebidos, processados e uma resposta aos mesmos pode ser diferente. Isso inclui tanto estímulos como tato, olfato, audição e visão, como o sistema proprioceptivo. Ele é responsável pela percepção sobre localização, posição e orientação do corpo no espaço, assim como por reconhecer a força exercida pelos músculos e o movimento das articulações.
- Além disso, o sistema vestibular, responsável pela manutenção do equilíbrio também pode ser afetado. “Pode haver tanto uma hipersensibilidade a esses sentidos, como uma baixa sensibilidade, com prejuízo na percepção e reação aos estímulos”, destaca a psiquiatra. Por isso, um pequeno barulho, que pode não parecer nada demais para a maioria das pessoas, pode ser uma verdadeira tortura para uma criança autista. Ou a entrada de uma pessoa em uma sala, na qual está uma criança autista, pode passar completamente despercebida.
- Mas é importante lembrar que, nem sempre o paciente vai apresentar todos esses sinais. Como já dito, o autismo tem diferentes níveis de gravidade e cada criança pode ter uma particularidade.
Tratamento
O autismo não tem cura, mas tem tratamento, que varia de criança para criança, de acordo com o grau de comprometimento e com as maiores dificuldades do paciente. A psiquiatra explica que o tratamento deve ser individualizado, de acordo com as necessidades de cada um, mas deve ser estruturado, sistematizado e estar presente nos diversos contextos sociais. “A terapia com melhores resultados e evidências é o ABA (Applied Behavior Analysis, ou Análise Aplicada ao Comportamento), uma técnica de intervenção. Envolvendo também acompanhamento psicoterápico, fonoaudiológico, de terapia ocupacional e nutricionista, tudo individualizado para cada paciente”.
Não existem medicamentos específicos para tratar o autismo, mas alguns remédios podem ser usados devido a alguns sintomas associados, como a agitação e agressividade.
Causas
Apesar dos inúmeros estudos acerca do autismo, a ciência ainda não conseguiu desvendar muitos pontos, como as causas da doença. “Sabe-se que é uma condição multifatorial e que há a presença de fatores genéticos, mas que são complexos e não estão esclarecidos”, diz a especialista. Há também a suspeita de diversos fatores ambientais.
Outro ponto que também não foi esclarecido por pesquisas é o fato do autismo atingir mais meninos do que meninas. É certo que a doença é cerca de cinco vezes mais comum em meninos do que em meninas e há suspeitas de que isso se deva a fatores genéticos, mas não há nada comprovado.
No final dos anos 80, uma a cada 500 crianças era diagnosticada com autismo. Um estudo americano mais recente apontou que esse índice já é de um diagnóstico a cada 68 crianças. A psiquiatra Maria Tereza cita algumas hipóteses para esse aumento significativo na prevalência do transtorno do espectro autista. Uma delas é a mudança nos critérios diagnósticos. Por exemplo, uma criança com dificuldade de comunicação e interação social poderia ser considerada apenas tímida antigamente, sem nenhuma investigação mais profunda do caso.
“O aumento do acesso aos cuidados de saúde também pode ter contribuído, assim, casos que antes não eram diagnosticados, agora estão sendo avaliados. E também há a suspeita de que pode ter ocorrido um aumento real nos casos de autismo, por conta de fatores de risco, como a sobrevivência de bebês prematuros e exposição a fatores ambientais”, completa Maria Tereza.