“Não tem problema”, pensou, e fez sexo sem camisinha. O primeiro sinal de que algo estava errado foi uma mancha nas costas. O diagnóstico? Sífilis.
Infelizmente, esse quadro vem aumentando ano após ano no Brasil, enquanto diminui em outras partes do planeta. E duas coisas podem explicar isso: os jovens brasileiros usam cada vez menos o preservativo nas suas relações sexuais, mesmo as casuais, o que é um risco não só de infecção pela sífilis como para outras doenças sexualmente transmissíveis, como gonorreia e herpes genital.
E o segundo fator é o desconhecimento dessa doença silenciosa, que não tem sintomas graves nos estágios iniciais. E isso é um problema enorme, porque quanto mais cedo é o diagnóstico, maiores são as chances de sucesso no tratamento. E a sífilis ainda pode deixar sequelas graves.
O que é sífilis?
A sífilis é uma Infecção Sexualmente Transmitida (IST), causada pela bactéria Treponema pallidum, que pode ser passada de mãe para filho na gravidez. “Essa doença existe desde a antiguidade e nem mesmo a penicilina foi capaz de eliminá-la”, conta Samir Abdul Fattah, infectologista do Hospital das Clínicas Luzia de Pinho Melo (HCLPM).
“É conhecida como ‘doença de mil faces’, pois possui inúmeras formas de apresentação clínica podendo ser mesmo assintomática e, se o infectado não tem sintomas, ele não procura assistência médica e continua transmitindo. Nesse estágio, a sífilis é diagnosticada apenas através de exames laboratoriais”, explica o infectologista.
A doença é tão perigosa que pode levar a problemas cardíacos, meningite e até à loucura. Em mulheres grávidas, a bactéria pode causar malformações, como microcefalia, cegueira e deficiência mental nos bebês. E pode levar à morte.
Na contramão do mundo, sífilis cresce assustadoramente no Brasil
Só no Estado de São Paulo o número de diagnósticos de infecções passou de 2.694, no ano de 2007, para 18.951 em 2013, um aumento de 603%, mas somente 14 estados têm feito registros, e os mais atuais são de 2014, segundo o Ministério da Saúde.
No caso específico de gestantes, a notificação é obrigatória desde 2005, o que permite aferir com mais precisão a evolução da doença. E os números são assustadores: em grávidas, a doença subiu de 1,8 mil para 21 mil no período de nove anos.
Em bebês com menos de um ano de idade, a sífilis congênita passou de 5 mil registros em 2008 para 16.266 ocorrências em 2014. A funesta previsão para 2016 é de 22 mil novos casos de sífilis congênita.
“Esse aumento importante do número de casos a cada ano, principalmente entre adultos jovens, com vida sexualmente ativa, e a consequente infecção de mulheres em idade fértil, de gestantes, culminando na sífilis congênita, pode ser explicado por alguns fatores como: tratamento inadequado ou interrompido, que dá uma cura parcial; paciente sintomático que não procura tratamento e continua o ciclo de transmissão; falta de penicilina benzatina e cristalina para o tratamento; falta de adesão ao tratamento por parte de parceiros sexuais e falta do uso de preservativos e medidas preventivas”, explica o infectologista.
Prevenção
O método mais seguro de prevenção é o uso de preservativos, disponíveis gratuitamente em todas as unidades de saúde, e o tratamento precoce de pacientes infectados e seus parceiros sexuais, com o objetivo de quebrar a correte de transmissão.
“Entretanto os serviços de saúde devem oferecer aos usuários outras formas de prevenção, inclusive para as outras Infecções Sexualmente Transmissíveis. O acolhimento com uma escuta humanizada é fundamental, pois dá a oportunidade de escolha individualizada da melhor forma de prevenção ao usuário, resultando no oferecimento de alternativas de prevenção”, acredita Samir.
Entre as alternativas de prevenção, que o infectologista chama de “cardápio preventivo”, estão:
– Orientação sobre ISTs, as principais doenças e seu modo de transmissão. “Informação é a melhor prevenção”, explica Samir.
– Preservativo masculino.
– Preservativo feminino.
– Gel lubrificante para homens que fazem sexo com homens, pois diminui o atrito e, consequentemente, traumas que facilitam a infecção.
– Vacinação para hepatite B.
– Realização de testagem para outras ISTs, como: HIV, hepatite B, hepatite C e sífilis, através de teste rápido ou não, com intuito de diagnóstico e tratamento precoce.
– Realização de teste de sífilis em mulheres grávidas em três momentos: primeiro e terceiro trimestres, e no momento do parto.
– Identificação, testagem e tratamento do parceiro sexual.
“Essas medidas devem estar disponíveis para todos os usuários que procuram os serviços de saúde, principalmente para populações expostas às Infecções Sexualmente Transmissíveis e as populações mais vulneráveis, como moradores de rua, pessoas privadas de liberdade, profissionais do sexo, dependentes químicos e outros”, defende o infectologista, que completa: “a eliminação da sífilis no adulto e sífilis congênita só depende de nós”.